19.6.07
O que não sou
Acédia (ou acídia) era um nome estúpido dado à sensibilidade de gente pouco acostumada - ou insensível - aos movimentos pendulares da vida. Duro, convicto, sempre satisfeito diante do acaso ou do futuro incerto, sensível como o sistema ocular de uma mosca. Assim era o cara completamente fechado em si mesmo, com o espírito fundido com os poucos que concedia confiança, que cerca de forma tranqüila e constante o espírito dos recém conhecidos. Tinha meia dúzia de idéias, sempre em mutação, sempre constantes e consistentes. Incapaz de afirmar sem antes elucubrar a idéia consigo mesmo - mas ainda assim com um certo incômodo. Ria alto das piadas pouco engraçadas de seus amigos. Trabalhava oito horas emburralhado, de má vontade, como se estivesse sendo estuprado; podia ser assaltado que não perderia a calma habitual: lhe roubariam só um objeto, não o seu tempo. Passava horas na frente do espelho. Amava a si mesmo como quem ama a última e única coisa que lhe resta - ele sabia que a vida era a última coisa que lhe restava. Sexo era pra ele impreterível. Boas ou ótimas companhias eram raras: conciliar sexo, amizade e racionalidade de relação é uma coisa difícil. Mais difícil era sentir necessidade que suas companhias durassem, pois todo tempo vivido era eterno enquanto durasse, pro resto da vida. Não iria perder a si mesmo por causa de ninguém e amava todo alguém lhe mostrasse o novo, o que o deixava em regozijos consigo mesmo.
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2 comentários:
Grandioso, como sempre.
bom texto!
é auto-biográfico?
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