6.4.10

Liberdades

Os intelectuais que defendem o capitalismo e a suposta liberdade de mercado têm os ares dos profetas do Antigo Testamento e dos evangelizadores cristãos. Sem dúvida, um resquício do racionalismo europeu, que se pretendia também como doutrina de salvação da humanidade. Lembram, igualmente, os velhos (e novos) socialistas que pregavam o reino da Justiça e da Igualdade.
O conceito ponta-de-lança do discurso liberal é, perdõem a redundância, o de liberdade ou, antes, as liberdades - de comércio, de opinião, de ir e vir, de comportamente, entre outras.
Até aqui, tudo bem!, pois também sou desse partido. Se alguém quiser plantar batata e vendê-la no mercado: que meta bronca! Se quiser queimar dinheiro, também!
Seria muito bom se, realmente, as pessoas tivessem maiores liberdades e condições de serem seus próprios patrões, tal como propõem os bons liberais.
Nesse sentido, é muito bonito usar e defender a palavra liberdade. Mas me pergunto: o que é a liberdade pensada pelos participantes do Fórum da Liberdade, que ocorrerá em breve? Mais ainda, liberdade para quem?
Quando os bons liberais falam em liberdade econômica, tratam o empreendedorismo como se fosse o fator fundamental para o sucesso da empresa capitalista. Eu, por outro lado, partilho a opinião do velho Marx: para se produzir capital, é necessário capital. E quanto mais capital - mais capital! De forma evidente, a questão não se encerra aí. É necessário saber como investir o capital inicial. Tem que se ter um mínimo de conhecimento técnico do ramo em questão. E tanto quanto estes pré-requisitos, precisa-se de um horizonte de aspiração o mais vasto possível, algo que, em partes, se constrói em casa. Este último ponto é fácil de verificar: basta perguntar ao filho de um pedreiro e ao de um médico quais seus sonhos de vida e o que pensam do futuro.
Enfim, parece-me que, numa sociedade de recursos desigualmente distribuídos, sejam eles econômicos, técnicos, simbólicos e sociais, a liberalização da economia só pode gerar aumento das mesmas desigualdades. Ou seja, os resultados últimos serão liberdades para lobos, com um possível aumento da restrição à liberdade para muuuita gente.
Uma liberdade mais ampla, em que se possa comprar e vender o que se quiser, se possa escolher a forma de trabalhar (ou não trabalhar), em que se possa dizer o que se pensa, acessar o que for desejado, não será alcançada apenas por meio de ações no campo econômico. Questões como política, cultura, educação são fundamentais.
Qualquer um sabe que economia não depende apenas de vontade e moral, com exceção dos defensores do livre mercado quando procuram explicar a existência da pobreza (tipo: "pobre é pobre porque é acomodado!"). Numa sociedade como a nossa, onde a desigualdade é estrutural e histórica, a noção de liberdade econômica não pode ser separada da existência de meios que garantam aos mais desafortunados o acesso ao know-how de diferentes ocupações, à crédito e à circulação de informação. Isso é: são necessárias políticas amplas, efetivas e sérias, que possibilitem cobrir as distâncias existentes entre os diferentes individuos para que, assim, a sensação e a possibilidade de liberdade sejam realmente mais possíveis a um conjunto maior de pessoas.
Termino por aqui, de "supetão", mas prometo, para a próxima postagem, a exposição da minha noção de liberdade capitalista.

Um comentário:

Rodrigo Cardia disse...

A "liberdade" defendida por esse tal fórum: http://blogdokayser.blogspot.com/2010/04/forum-da-casinha.html